23 de novembro de 2024
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José Sarney – Ex-Presidente da República

A desigualdade sempre foi o grande sonho do homem, desde que teve consciência de sua condição humana. Fizeram-se revoluções, escreveram-se tratados, pensadores, poetas e políticos construíram formulas e meios de chegarmos a ela. 

A grande Revolução Francesa de 1789, considerada um marco na história da humanidade, resumiu seus ideais em três palavras chaves e divinas: liberdade, igualdade e fraternidade. Na Declaração da Independência americana Thomas Jefferson ampliava essas aspirações, dizendo que todos os homens têm direito à “busca da felicidade”. Associava-se a felicidade aos anseios do homem.

Chegou-se mesmo a considerar que o século 18 fosse o da liberdade, o 19 da igualdade e o 20 da fraternidade. E qual seria o século da felicidade? Os poetas divagaram muito sobre ela e até mesmo se existe. 

Hoje, os estudiosos da alma humana buscam em Yung a visão de que todos morremos frustrados, com a mágoa de não termos vivido a vida que devíamos ter vivido. E aí entra a angústia dos erros, dos pecados e até mesmo de ter pecado.

Borges falava mesmo que se tivesse que viver de novo não seria tão prudente quanto foi, sempre “usando paraquedas”. Divagações a parte, vivemos um período em que a desigualdade diminuiu no país e milhões de brasileiros romperam a linha da pobreza, e que foi freado pela crise dos últimos anos. Mas me preocupam, não só a desigualdade de pessoas, como as desigualdades espaciais. Estas são as que marcarão o futuro dos países e do mundo. Já vinte países, no balanço alimentar e de modos de sobrevivência, não têm condições de existir e vivem da caridade.

Surge o problema da água como o mais dramático dos tempos que virão. Todos somos água e faltará água para que a vida continue. Onde ela existe não se pode mudar, pois a geografia é a única coisa imexível, como diria certo ministro dos anos 90, embora o mistério que Deus utilizou para fazer o mundo ainda não nos permita saber o que acontecerá com as mudanças climáticas, se reagiremos a tempo ou marcharemos para o desastre.

Continuo pensando que, no Brasil, o grande problema ainda é e será o das desigualdades regionais. O Centro Sul transformou se num buraco negro, que é um lugar em que a gravidade é tanta que nem a luz escapa de sua atração. É o que acontece com as regiões pobres do Brasil, sugadas pelo Centro-Sul. 

O único período em que as desigualdades regionais inverteram suas setas de maneira consistente foi nos anos 85-90. Mais recentemente houve um pequeno aumento da desigualdade na região Sudeste, enquanto o resto do Brasil teve diminuição. Consequência do desemprego, que chegou primeiro nas áreas mais industrializadas. Mas continua a concentração irresistível. Essa semana uma pessoa falou-me das saudades e da beleza de sua cidade em Goiás, mas terminou dizendo-me: “Me corta o coração porque a população está diminuindo, só ficam os velhos.” Os novos são atraídos pelo Centro Sul. O interior vira fantasma e no Norte e no Nordeste é pior, além do êxodo fica a solidão e a saudade dos que jamais voltarão.

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